Texto Que Faz Pensar

Demasiadas missas… e tão poucas mesas

Há padres que celebram seis, sete, oito missas num só fim de semana.
Correm de aldeia em aldeia, de igreja em igreja, como quem apaga fogos, como quem tenta segurar um edifício que já racha pelas fundações. E o que era dom, festa e encontro, transforma-se em cansaço, repetição, ritual vazio.

A Eucaristia nasceu à mesa.
Jesus não instituiu um cerimonial, instituiu uma refeição.
Partiu o pão, partilhou a vida, pôs-se ao lado dos pobres, dos pecadores, dos esquecidos.
E disse: “Fazei isto em memória de mim.”

Mas esse “isto” não era apenas o rito. Era a mesa aberta, a fraternidade, a comunhão que nasce da partilha.
Hoje, muitos já não reconhecem ali o gesto de Jesus.
Uns vão à missa como quem cumpre um dever.
Outros esperam apenas a comunhão rápida, ou um pedido atendido, ou uma intenção por um defunto.
E assim se perde o essencial: a experiência de sermos corpo, de sermos comunidade, de sermos família.

A Igreja, cansada e envelhecida, multiplica missas…
Mas multiplica vida?
Multiplica mesas onde todos cabem?
Ou estamos apenas a manter de pé um ritual que já não fala, já não aquece, já não desperta sede de Deus?

Jesus quis uma mesa larga, onde houvesse pão para todos, dignidade para todos, amor para todos.
Não um privilégio clerical, mas um direito cristão: celebrar a Sua presença no meio de nós.
E enquanto faltam padres e sobram missas, faltam comunidades vivas, e sobram bancos vazios.

O risco é grande: a Igreja desmorona-se não pelo ataque de fora, mas pelo vazio de dentro.
Quando esquecemos que o que salva não é a repetição, mas a vida partilhada.
Não a quantidade de missas, mas a intensidade da comunhão.

E talvez seja tempo de parar, olhar de frente e voltar ao começo:
à mesa de Jesus.
À simplicidade do pão repartido.
À beleza de uma comunidade que aprende a viver da solidariedade, da escuta e do amor.

Porque se a missa não nos leva a partilhar a vida, a cuidar uns dos outros, a construir fraternidade… Então já não é memória de Jesus. É apenas um eco distante do que Ele sonhou.

João Torres é padre católico na arquidiocese de Braga.