CONSULTA SINODAL NAS COMUNIDADES DA PARÓQUIA DE ALVOR
INQUÉRIO REALIZADO EM DEZEMBRO DE 2021
O QUE O POVO DE DEUS REALMENTE QUIS DIZER

PARTE I – OS NÚMEROS

I. Contributos sobre a Igreja (aspectos gerais).
+ Os rituais da Igreja são austeros e tristes de mais (15,6% + 35,2%).
+ A Igreja carece de uma renovação/actualização (58% + 25,4%).
+ A Igreja deve mudar para acompanhar a sociedade actual (56% + 26%).
+ Quase 100% dos fiéis defende o fim do celibato obrigatório e o acesso das mulheres aos ministérios ordenados.
+ Relevante para afastar o crente da Igreja: os padres e a sua maneira de se relacionarem com as comunidades (20,5%); a falta de clareza na mensagem que passa (14,7%); os ideais que a Igreja defende (13,2%).

II. Pontos fortes da paróquia
+ Grande empatia com a pessoa do pároco: a sua juventude e trato fácil e o modo como preside às celebrações litúrgicas são factores facilitadores de uma liderança para novos desafios pastorais.
+ A igreja matriz de Alvor, enquanto templo historicamente reconhecido e cheio de memórias, é outro elemento positivo e agregador. Neste contexto, as obras em curso não são reconhecidas como constrangimento.

III. Pontos fracos da organização paroquial: algumas questões práticas
+ Condições para o crente se sentir em casa: aquecimento (28%); acolhimento e atenção pessoal (41%); horários mais apelativos (41%).
+ O que menos se gosta: falta de aquecimento no inverno; mandões na igreja ou demasiada autoridade da parte de algumas pessoas (este item é muitas vezes referido!); falta de ações de evangelização, designadamente visita aos doentes; som do órgão muito alto a sobrepor-se às vozes; hábitos individuais de trabalho, sem troca de ideias e debates; iluminação deficiente; falta de guarda-vento na porta principal (Matriz de Alvor?).
+ Necessidade de formação (30% + 26%). Temas mais referidos: História da Igreja, Liturgia, Pastoral sócio-caritativa, Formação bíblica geral.
+ Modo de formação preferido: mesas-redondas com vários participantes (17,4%).
+ Principal razão para o cristão não ter algum papel apelativo dentro da paróquia: nunca ninguém perguntou a sua opinião (30%).
+ Para os fiéis serem ouvidos e expressar opiniões: assembleias paroquiais regulares; reuniões periódicas de pequenos grupos; caixa de sugestões; uso frequente do facebook e do site da paróquia.

IV. Em síntese: três ideias estruturantes para o futuro da paróquia
Desta consulta podemos destacar três grandes questões/desafios:
i) Ainda que difusa ou pouco esclarecida, a mudança é uma necessidade claramente sentida pela esmagadora maioria dos fiéis.
ii) A formação é reconhecida como uma necessidade e um desafio para que alguma coisa comece a mudar.
iii) É muito significativa a insistência no acolhimento, na atenção às pessoas, no templo ou fora dele, e no desabafo de algumas situações de abusos de autoridade por parte de quem tem pequenos poderes dentro do sistema.
Outro dado significativo: 40% dos fiéis revêem-se nos itens “Nunca ninguém me perguntou a minha opinião” e “Emiti a minha opinião mas senti que ela foi ignorada”.
Há, também, referências ao desejo de construção de uma comunidade mais fraterna, conforme aos valores do Evangelho.

PARTE II – PARA LÁ DOS NÚMEROS
V. O que está em causa: A sinodalidade como interpelação espiritual
Importa, antes de mais, não perder de vista os objectivos do processo sinodal. Em Outubro de 2021 foi lançado pelo Papa Francisco um projecto de consulta do Povo de Deus, desafiando a Igreja inteira.
A interrogação fundamental que orienta esta consulta do Povo de Deus é a seguinte:
Anunciando o Evangelho, uma igreja sinodal “caminha em conjunto”: como é que este “caminhar juntos” se realiza hoje na nossa Igreja particular? Que passos o Espírito nos convida a dar para crescermos no nosso “caminhar juntos”? Que dificuldades e obstáculos? Que novas ideias suscitaram? Que caminhos se abrem para a nossa Igreja particular? Onde, nestas experiências, ressoa a voz do Espírito? «Que os leigos finalmente falem. É a sua vez de falar!», disse o Papa. Devemos medir o alcance deste convite. De repente, o apelo à sinodalidade leva-nos de volta à realidade da Igreja como o Corpo de Cristo. Realidade orgânica, onde somos todos, igualados pelo batismo, uns para os outros.
A consulta feita, cujas respostas superaram as expectativas, não deve ser vista como um mero inquérito sociológico, estatístico, ou um estudo de opinião.
Então, em que registo se deve ler os resultados desta consulta?
Requer-se uma leitura em chave eclesiológica.

Realizou-se, pela primeira vez, um processo de escuta do Povo de Deus.
Isto é, a Igreja particular, povo de batizados, no exercício do sacerdócio comum como fundamento essencial do ser cristão, como comunidade de pessoas capacitadas e impulsionadas pelos dons do Espírito, foi chamada a pronunciar-se sobre o presente e o futuro da comunidade.
A comunidade paroquial foi chamada a pronunciar-se sobre o presente e o futuro: PARA QUÊ?
Para melhor ser fiel ao que Deus nos vai pedindo
(i) no relacionamento com os outros,
(ii) na atenção aos sinais dos tempos e suas interpelações,
(iii) na disponibilidade para a novidade que a fidelidade ao Evangelho do Reino de Deus vai exigindo.
Seria desastroso para o futuro destas comunidades não entendermos o que realmente está em causa neste processo de consulta.
A fidelidade criativa à escuta do Espírito Santo faz-se através de múltiplas mediações: – desde a Palavra de Deus aos desafios da vida da comunidade e à experiência das pessoas. Através dessas mediações, descobrimos caminhos a seguir, ruturas a fazer, opções a tomar. Este inquérito é mais uma forma de mediação a partir da qual podemos responder melhor ao que o Senhor nos pede.
A formação da grande maioria dos fiéis é muito deficiente: fez-se na catequese que receberam e faz-se nas homilias que escutam. Mas, as respostas apresentadas, na simplicidade/pobreza da sua linguagem concreta, representam o sentir dos fiéis, são a expressão possível do “sensus fidei” dos crentes, aqui e agora. Esta consulta foi a forma de os fiéis, nas paróquias de Alvor e Pedra Mourinha, começarem a contribuir para uma “Igreja sinodal”, respondendo ao projecto lançado pelo Papa Francisco.

Há que avaliar o que fazemos e as omissões que cometemos, de modo a corrigir os factores que contribuem para a falta de sentido de corresponsabilidade de muitos cristãos. Temos aqui chaves de leitura e impulsos de ação cruciais para rever muita coisa na realidade que vivemos, a exigir processos de transformação pessoal e comunitária.
Verifica-se que as respostas indicam grande disponibilidade para a mudança. E não pode haver ilusões de que estamos perante uma conversão pastoral e estrutural que exigirá tempo, persistência e coragem evangélica (parresía).
Fica uma pergunta muito simples mas incontornável e cheia de consequências: O que fazer com esta consulta?
Que os belos versos de José Augusto Mourão nos animem: “enquanto não sabemos o caminho, cantemos já o dom de caminhar; se estamos juntos, não teremos medo: alguém no invisível nos espera”.

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