— Mergulhando no Génesis (III)
– A segunda Aliança
Nesta segunda Aliança, irá ser central a figura de Abraão. Deus manifestou-se a ele como o El Shadday (Deus Omnipotente) [Cf.Gn.17,1-3] a Abrão. Ele chamava-se “Abrão” (Avram= אברם = Pai exaltado) para “Abraão” (Avraham = אַבְרָהָם = Pai de multidão). Com a mudança de nome dá-se a mudança de missão. Ora, Abrão possuía uma escrava chamada Agar e possuía a sua própria esposa. O facto de possuir uma escrava denota a posição social que Abraão detinha no meio onde estava: era alguém economicamente bastante rico, ainda que fosse nómada e tivesse a sua própria tribo. Porém, Abrão não tinha filhos. A sua esposa Saray, consentiu que a sua escrava Agar lhe desse um filho. Então ela concebeu e deu à luz um filho (Gn.16,16) a quem foi posto o nome de Ismael.
“El Shadday” vai então mudar o nome de Abrão (Gn.17,5) para Abraão, porque ele haveria de ser “pai de uma multidão de nações” e a Saray, que que quer dizer “princesa” para “Sara” (שרה) cujo o significado é o mesmo. Eis então o teor da segunda Aliança: “Declarou também Deus a Abraão: “Quanto a ti, obedecerás à minha Aliança, tu e todos os teus descendentes, de geração em geração. E eis a minha Aliança contigo e com toda a tua descendência futura, Aliança que deverá ser guardada de geração em geração: Todos os do sexo masculino entre vós deverão ser circuncidados na carne. Fareis circuncidar a carne de vosso prepúcio, e essa será a marca da Aliança entre mim e vós. De tua geração em diante, todos os meninos, ao completarem oito dias de vida, terão de passar ao fio da circuncisão. Tanto os nascidos em tua casa quanto os escravos, e os que forem comprados por dinheiro a algum estrangeiro e que não pertençam à tua raça. Sejam nascidos em tua casa, sejam comprados, todos terão de ser circuncidados. Minha Aliança, marcada em vossos corpos, será uma Aliança perpétua! Portanto, qualquer sexo masculino cuja carne do prepúcio não tiver sido cortada, mantendo-se incircunciso, será eliminado do meio do seu povo: ele rompeu a minha Aliança!” (cf.Gn.17,9-14). Se bem que nos recordamos do último encontro, Deus quando sela uma Aliança deixa um sinal visível dessa mesma Aliança. Na anterior era o “arco-íris”, na actual, é uma marca na carne do Homem: o corte da pele do prepúcio, chamado de “circuncisão”.
Após isto, Deus vai prometer a Abraão que lhe iria outorgar um filho de sua própria esposa, Sara. Abraão riu (Gn.17,17) por causa da sua avançada idade e da sua esposa.
Então Yahweh Deus vai manifestar-se a Abraão junto do carvalho de Mambré (Gn.18, 1-16). Vejamos este relato: “O SENHOR apareceu a Abraão no bosque sagrado dos carvalhais de Mambré, quando ele estava sentado à entrada de sua tenda, na hora mais quente do dia. Abraão ergueu os olhos e observou três homens em pé, a pouca distância. Assim que os viu, saiu da entrada de sua tenda, correu ao encontro deles e prostrou-se, encostando seu rosto no chão. Então declarou Abraão: “Meu Senhor, se encontrei graça a teus olhos, não passes pelo teu servo sem te deteres por algum tempo. Traga-se um pouco de água, lavai os pés e repousai debaixo desta árvore; também trarei um bocado de pão; refazei as vossas forças, visto que chegastes até vosso servo; depois seguireis vossa jornada!” Ao que eles responderam: “Assim seja. Faz como disseste”. Abraão dirigiu-se apressadamente para sua tenda e pediu a Sara: “Toma depressa três medidas da melhor farinha, amassa-a e prepara três pães!” Em seguida, correu ao rebanho e escolheu o melhor e mais tenro vitelo, e o deu a um servo, que se apressou em prepará-lo. Tomou igualmente coalhada, leite, e o vitelo que preparara, e colocou tudo diante dos visitantes; entretanto, permaneceu de pé junto deles, sob a árvore, observando-os enquanto comiam. Os hóspedes lhe indagaram: “Onde está Sara, tua esposa?” Ele afirmou: “Está na tenda”. Então Ele lhe prometeu: “Voltarei a ti no próximo ano; então Sara, tua esposa, terá um filho!” Sara escutava a conversa, na entrada da tenda, atrás dele. Ora Abraão e Sara já eram idosos, com idade muito avançada; e em Sara, o ciclo mensal das mulheres já havia cessado. Riu-se, portanto, Sara em seu íntimo, considerando: “Agora que estou velha e velho também está o meu senhor, como ainda teremos prazer ?” Entretanto, o SENHOR questionou Abraão: “Por que se ri Sara, conjeturando: ‘Será possível que vou dar à luz, agora que sou velha?’ Acaso existe algo extraordinário demais para Yahweh? Nesta mesma época de primavera, no próximo ano, retornarei à tua presença, e Sara terá um filho”. Sara, ao ouvir essas palavras ficou amedrontada e mentiu: “Não! Eu não ri!” No entanto Ele foi categórico: “Sim! É verdade que tu riste!” Detenhamo-nos neste relato: Yahweh Deus aparece a Abraão junto ao Carvalho de Mambré. Junto à entrada da sua tenda, vê três figuras a quem chama: “Adonay” (אֲדֹנָי = “meus senhores”). Depois vai utilizar a forma singular ao invés do plural… Estranho, não? Pois é, os Padres da Igreja, aqueles homens que, na Igreja primitiva se dedicavam ao estudo e anúncio da palavra de Deus, viram neste relato a manifestação da Santíssima Trindade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Um Deus, três Pessoas Divinas diferentes. Também neste relato encontramos a base daquilo que será a teologia da “Encarnação do Verbo” ou seja: do Filho de Deus fazer-se carne no meio de nós. Senão vejamos: o atributo de Deus apresentado no Génesis é ser El Shadday (Deus Omnipotente), porque para Yahweh nada é impossível (Gn.18,14: Acaso existe algo extraordinário demais para Yahweh?). A mesma coisa é dito pelo anjo a Maria: “Para Deus, com efeito, nada é impossível” (Lc.1,37).
Abraão selou esta segunda Aliança e, a partir dela, formou um povo cujo número é incontável. Ainda que não façamos a circuncisão do prepúcio, pois dela não advém a salvação (Act.15,1), todos somos chamados a fazer a circuncisão de coração, pois o Senhor diz: “Circuncidai, pois, o vosso coração espiritual; retirando toda a obstrução carnal, e deixai de ser insubmissos e teimosos!” (Dt.10,16). E isto nada mais é do que a conversão. Também nós somos filhos espirituais de Abraão. Por outro lado, vemos como através de imagens, vamos assistindo à prefiguração daquilo que se inaugurará com Jesus: Uma nova e eterna Aliança selada com o sangue do Cordeiro de Deus; a Omnipotência de Deus manifesta no meio dos homens. Deus deu-nos um novo nome através do seu Filho Jesus, assim como deu a Abraão. Assim, colocamos agora algumas questões:
a) – Por acaso já circuncidei o meu coração afim de receber o nome novo de “Cristão”, ou continuo insubmisso a Deus e no amor ao próximo?
b) – Àqueles que já foram baptizados: como está a minha Aliança com Deus através do meu baptismo? Àqueles que ainda não foram baptizados: Como espero viver essa Aliança com Deus?
c) – Fazendo agora uma retrospectiva da minha vida: Em que circunstâncias da minha história pessoal constatei que, para Deus, nada é impossível?
–Texto para meditar: Lc.1,26 – 55.–